Isabel Cristina Silva Vargas
Pelotas / RS
Um novo tempo
Ela está na terceira idade. Sempre foi uma pessoa de riso fácil. Opção pela alegria e simpatia. Nunca foi fútil. Enfrentou agruras na infância, na adolescência. Sua única opção era estudar. Estudar, confiar em si, buscar novos caminhos para oportunizar vida melhor aos pais.
Relembrando o passado poderia dizer que foi bem-sucedida. Nível superior, respeitada no trabalho, conseguiu adquirir imóvel próprio na cidade e na praia, educou 4 filhos, ajudou os pais, irmão, viveu para a família. As perdas foram inimagináveis. A tudo suportou. Foi forte como não imaginava que seria. A vida foi seguindo seu curso. Filhos crescidos, cada um formando seu ninho. Viúva, queria continuar forte. Mais uma vez, cumpriu seu papel. Ensinou-os a voar. Empurrou-os mostrando o caminho a seguir, garantindo-lhes lugar se fosse necessário voltar. Antes, alegre, participativa, sempre buscando aprendizados novos, acreditava estar preparada para a fase que se descortinava à sua frente. Ficou só e não queria dar preocupação ou trabalho aos filhos. Cercou-se dos animais de estimação que ficaram com ela. Como o tempo começou a pesar, preferiu ficar a cuidar deles sozinha pensando que isso preencheria sua vida. Sempre foi uma pessoa que privou por sua privacidade, embora fosse comunicativa. Não gostava de viver na casa alheia. Abandonou a pintura, os grupos de convivência que participava na universidade. Sempre gostou de gente, por isso trabalhava com prazer, embora só tenha descoberto essa característica na meia idade. Gosta de ler e por isso acreditou que viver em sua própria companhia era sinal de boa autoestima. Teria os livros, a escrita através da qual exorcizou as dores, o artesanato, o tricô, os cães, a casa para cuidar e filhas e netos por companhia eventual nos finais de semana. No final do ano mais perda de familiares. Quando perdeu o seu cãozinho favorito no alvorecer do último dia do ano passado, deitado em seu peito, sentiu muito. Já tinha a outra que tinha passado por cirurgia e estava enferma desde a primavera de 2017 vindo a falecer no início do atual inverno. Sentiu-se mais uma vez impotente e fragilizada. Sempre teve medo do inverno que dependendo do grau de sofrimento que impõe aos idosos os leva para a viagem sem retorno. E este está especialmente frio. Gélido. Impiedoso. Seu coração deu sinais de fraquejar. Sentia-se sozinha, isolada, triste, mesmo sempre tendo dito que queria ser uma idosa alegre, alto astral e leve. Seu coração saiu do compasso. Quase extrapolou seus batimentos. Perigo! Foi parar no hospital. Conseguiu sair. Agora está à espera de exames para saber como será seu futuro. Enquanto isso, reza para observar a próxima primavera despontar e para a mudança de idade comemorar em novembro. Tenta estabelecer metas a curto, médio e longo prazo como forma de se fortalecer e ludibriar a doença e o tempo inexorável. No momento, estabelece um acordo com o calendário natural. Está a enumerar um arrazoado de motivos para convencê-lo e, sobretudo, convencer a si mesmo que merece uma nova chance. |
UM NOVO TEMPO
Ela está na terceira idade. Sempre foi uma pessoa de riso fácil. Opção pela alegria e simpatia. Nunca foi fútil. Enfrentou agruras na infância, na adolescência. Sua única opção era estudar. Estudar, confiar em si, buscar novos caminhos para oportunizar vida melhor aos pais.
Relembrando o passado poderia dizer que foi bem-sucedida. Nível superior, respeitada no trabalho, conseguiu adquirir imóvel próprio na cidade e na praia, educou 4 filhos, ajudou os pais, irmão, viveu para a família.
As perdas foram inimagináveis. A tudo suportou. Foi forte como não imaginava que seria.
A vida foi seguindo seu curso. Filhos crescidos, cada um formando seu ninho. Viúva, queria continuar forte.
Mais uma vez, cumpriu seu papel. Ensinou-os a voar. Empurrou-os mostrando o caminho a seguir, garantindo-lhes lugar se fosse necessário voltar.
Antes, alegre, participativa, sempre buscando aprendizados novos, acreditava estar preparada para a fase que se descortinava à sua frente.
Ficou só e não queria dar preocupação ou trabalho aos filhos.
Cercou-se dos animais de estimação que ficaram com ela. Como o tempo começou a pesar, preferiu ficar a cuidar deles sozinha pensando que isso preencheria sua vida. Sempre foi uma pessoa que privou por sua privacidade, embora fosse comunicativa. Não gostava de viver na casa alheia.
Cercou-se dos animais de estimação que ficaram com ela. Como o tempo começou a pesar, preferiu ficar a cuidar deles sozinha pensando que isso preencheria sua vida. Sempre foi uma pessoa que privou por sua privacidade, embora fosse comunicativa. Não gostava de viver na casa alheia.
Abandonou a pintura, os grupos de convivência que participava na universidade.
Sempre gostou de gente, por isso trabalhava com prazer, embora só tenha descoberto essa característica na meia idade.
Sempre gostou de gente, por isso trabalhava com prazer, embora só tenha descoberto essa característica na meia idade.
Gosta de ler e por isso acreditou que viver em sua própria companhia era sinal de boa autoestima. Teria os livros, a escrita através da qual exorcizou as dores, o artesanato, o tricô, os cães, a casa para cuidar e filhas e netos por companhia eventual nos finais de semana. No final do ano mais perda de familiares.
Quando perdeu o seu cãozinho favorito no alvorecer do último dia do ano passado, deitado em seu peito, sentiu muito. Já tinha a outra que tinha passado por cirurgia e estava enferma desde a primavera de 2017 vindo a falecer no início do atual inverno. Sentiu-se mais uma vez impotente e fragilizada.
Sempre teve medo do inverno que dependendo do grau de sofrimento que impõe aos idosos os leva para a viagem sem retorno. E este está especialmente frio. Gélido. Impiedoso.
Seu coração deu sinais de fraquejar. Sentia-se sozinha, isolada, triste, mesmo sempre tendo dito que queria ser uma idosa alegre, alto astral e leve.
Seu coração saiu do compasso. Quase extrapolou seus batimentos. Perigo! Foi parar no hospital. Conseguiu sair.
Agora está à espera de exames para saber como será seu futuro. Enquanto isso, reza para observar a próxima primavera despontar e para a mudança de idade comemorar em novembro.
Tenta estabelecer metas à curto, médio e longo prazo como forma de se fortalecer e ludibriar a doença e o tempo inexorável.
No momento, estabelece um acordo com o calendário natural. Está a enumerar um arrazoado de motivos para convencê-lo e, sobretudo, convencer a si mesmo que merece uma nova chance.
Isabel C S Vargas
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