sexta-feira, 29 de junho de 2018

REVISTA EISFLUENCIAS DE JUNHO 2018/ANO VIII/LII

 
Isabel C S Vargas
 
 
O ANOITECER NO INVERNO DO SUL
Por Isabel C S Vargas

Estamos no sul do Brasil. Início de inverno. Anoitecer pode ter vários sentidos.
Vivemos em uma terra abençoada onde se plantando tudo, ou quase tudo prolifera, mas a região do Pampa que se estende por toda uma região meridional da América, também sofre com as agruras do inverno e o anoitecer pode se constituir em sofrimento para os menos favorecidos.
Para o gaúcho do campo ou da cidade anoitecer de inverno pode ser um momento lindo em família. Calor do fogo da lareira, ou do fogão à lenha, ou, ainda, do piso aquecido para os mais abastados, associado ao ar condicionado. Fogão à lenha é costume em grande maioria dos lares, tanto da região da campanha quanto da cidade.
Família ao redor do crepitar das chamas, chimarrão, chá ou vinho para esquentar e espantar o frio que, com facilidade beira a zero grau. Sobre o fogão comidas típicas. Bolo assado, uma sopa quentinha, batata doce, pinhão, amendoim, pipoca. Prazeres que quem é daqui não dispensa.
Pesados ponchos de lã tecidos pelas mulheres, touca de lã de ovelha, luvas, botas de cano longo, fogueira nas noites de São João, gaita tocando, pares na maior bailanta nos galpões das propriedades rurais ou nos locais de diversão distantes do centro da cidade.
Uma melodia ao violão aquece os corações nos anoiteceres do sul, nos bares frequentados pelos jovens universitários.
Em contrapartida, mais do que nunca, se faz necessário ser solidário nestas longas noites de frio que a geada embranquece os campos deixando-os cobertos de uma fina camada de gelo.
Desabrigados sofrem muito no anoitecer de nossa região. Há moradores de rua em profusão que se abrigam nas marquises de lojas, estabelecimentos bancários, edifícios pois os albergues para desvalidos não comportam toda essa população sofrida.
Vários grupos se mobilizam levando a essas pessoas um pouco de conforto espiritual, moral e material. Sentir-se acolhido faz a pessoa sentir-se menos só. Alguns levam roupas limpas, outros dedicam-se a levar sopa servida em caixas de leite em determinado ponto da cidade, há os que levam café preto com sanduiche, outros um copo de leite quente com pão e mortadela para saciar a fome do corpo e amenizar a sensação de abandono que se intensifica a cada anoitecer quando o não ter uma cama quente, cobertas limpas e companhia de família faz se intensificar o abandono moral.
Esse trabalho ocorre durante as noites, sob o céu onde se destaca o Cruzeiro do Sul, durante o ano, mas, a necessidade é infinitamente maior durante o inverno em cujas noites muitos idosos se entregam ao sono eterno pelo frio que chega a sete graus negativos.
Campanhas são realizadas para os animais de rua que também padecem mais depois que o sol se esconde.
Tenho uma filha que se dedica a este trabalho nas noites de domingo nas quais a ajudei na preparação do alimento.
Nos postos de gasolina com proprietários que são de coração sensível ao sofrimento dos animais, encontramos casinhas para os cães que durante o dia perambulam pela cidade e que ao anoitecer nelas se abrigam e recebem alimento e afago dos funcionários.
O anoitecer pode ser momento de amor ou de dor, de alegria ou de tristeza, de sonho ou pesadelo, de concepção ou de morte, e cabe aos mais afortunados se desapegarem um pouco para minimizar o sofrimento alheio.
Eu já separei roupas para o brechó solidário que se realiza em vários pontos da cidade e você, leitor desta crônica vai fazer com que o anoitecer do outro se transforme em um raiar de novo dia com mais amor e solidariedade?

Isabel C S Vargas
Pelotas - Rio Grande do Sul - Brasil
http://www.icsvargas3.blogspot.com.br/
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